Qual é a p%&@ do motivo para xingarmos?

O que são palavrões? Por que os usamos? O que acontece em nosso cérebro quando deixamos escapar palavras como f%∆@-$€? Diretamente do Brooklyn, em Nova Iorque: a ciência do xingamento.

“A prática tola e maldosa de xingar ou ofender de forma profana é um vício tão maldoso e baixo que qualquer pessoa com senso e caráter a despreza e abomina.”
— George Washington

“Eu fui acusado de falar vulgaridades. Isso é uma acusação de bosta.”
— Mel Brooks

“Não falo palavrão só falo as coisas como elas são.”
— Dercy Gonçalves

“Palavrão não é feito pra qualquer um dizer, depende da boca e da inteligência de quem fala.”
— Dercy Gonçalves

Não importa se você tem uma opinião firme contra xingamentos, como George Washington, ou se é um desbocado que não acha necessário se desculpar, como Mel Brooks e Dercy Gonçalves: você não pode negar que palavrões são parte significante da comunicação humana. Então vamos deixar as reações automáticas de constrangimento de lado, colocar nossos jalecos e analisar palavrões com imparcialidade científica.

Aviso: Este artigo contém um número suficiente de palavrões para ser censurado para menores de 18 anos. Não se pode fazer omeletes sem quebrar a droga dos ovos!

O que torna uma palavra um “palavrão”?

Palavras “sujas”

Para uma palavra ser considerada um xingamento, ela tem que ter o potencial de ofender, cruzando barreiras culturais e chegando ao território do tabu. Como regra geral, palavrões remetem a temas tabus. Isso é lógico: o tópico passa dos limites do aceitável e, por isso, as palavras relacionadas a ele também não devem ser faladas. Alguns tópicos são tabus quase universais — morte, doença, excremento — você sabe, coisas de “mal gosto”. O sexo é outro tabu clássico: pense nas palavras fuck! em inglês, fanculo! em italiano e блядь! em russo.

Mas os temas preferidos para o xingamento também podem refletir diferenças entre culturas. Os alemães têm uma postura bem relaxada com o sexo e a nudez, portanto eles raramente usam temas ligados à sexualidade para xingar. Essas palavras são ditas tão raramente que ainda têm o poder de fazer as pessoas corarem. Como resultado disso, a palavra ficken tem uma conotação muito mais pesada para a maioria dos falantes de alemão do que seu equivalente em inglês, fuck. Xingamentos em alemão são mais pé no chão. Eles se referem a fezes como Kacke!, Mist! e Scheiße! umas das palavras mais conhecidas dessa língua. Ela é tão usada por alemães que adquiriu um valor parecido com o “droga”.

Contexto

O tema não é o único critério para palavrões: contexto também tem um papel importantíssimo. Sexo pode ser um tema tabu, mas não em no consultório ginecológico. Tente insultar alguém usando termos médicos e sua vítima provavelmente ficará confusa: “Você me chamou de cabeça do órgão reprodutor?. Entre amigos você pode xingar de forma descontraída e num tom de brincadeira, mas as mesmas palavras podem ser percebidas como insultos durante uma entrevista de emprego.

Blasfêmia

Fora de contexto, coisas consideradas sagradas criam outra categoria de xingamentos: a blasfêmia. Por exemplo, “Deus”, “inferno” and “Jesus Cristo” são apropriados no contexto de um sermão mas, em algumas partes do mundo, essas palavras também são usadas para ofender. Franceses e canadenses levam o chamado “xingamento litúrgico” ao seu ápice. Um quebequense cheio de raiva pode soltar uma bomba como “Criss de calice de tabarnak d’osti de sacrament!”, que, traduzida literalmente, seria “Cristo do cálice do tabernáculo da hóstia do sacramento!” Isso pode soar inofensivo em português ou inglês, mas é a versão franco-canadese de pØ&&@.

O poder do #&@%!

Assim como antibióticos, xingamentos podem perder o efeito se usados com muita frequência. Algumas séries da tevê a cabo americana, por exemplo, despejam sobre os telespectadores uma série de palavras que costumavam fazer muita gente se sentir constrangida, mas que se tornaram cada vez mais naturais. Então, se você considera alguns palavrões totalmente normais, pode ser que você tenha passado muito tempo em frente ao televisor. No entanto, é difícil dizer se a televisão está “corrompendo” os telespectadores com o aumento de xingamentos ou se o que acontece nas ruas acabou sendo refletido nos programas. Independentemente disso, essa mudança acabou funcionando como um tipo de vacina contra o poder dessas palavras, causando até mesmo um tipo de imunidade. Se os tabus mudam, os xingamentos também têm que mudar.

Enquanto em alguns lugares alguns tabus desaparecem, provavelmente devido à influência da televisão, em alguns outros países a mídia e a sociedade têm uma postura um pouco mais conservadora sobre o uso de palavrões. No Brasil, por exemplo, há uma grande diferença entre a linguagem falada entre amigos e o que é aceito em público. Um grupo de amigos pode considerar uma palavra como absolutamente normal quando falada entre eles, mas essa mesma palavra pode chocar se for usada na mídia ou por pessoas em outro contexto.

Por que xingamos?

“Em algumas circunstâncias a profanidade causa um alívio negado até mesmo à oração.”
— Mark Twain

”O “foda-se” é um palavrão libertador que te desestressa e coloca no eixo.”
— Leandro Hassum , Nós na fita

”É mais difícil aguentar as decepções da vida quando não se sabe nenhum palavrão.”
— Calvin

1. Catarse

Na maioria das vezes, xingar é uma reação emocional. Quando estamos frustrados, surpresos ou com raiva, o palavrão causa um alívio. Pesquisas mostram que xingar aumenta a capacidade do corpo de tolerar a dor. Para testar isso, pesquisadores da universidade de Keele, no Reino Unido, pediram para voluntários deixarem suas mãos na água fria o máximo que pudessem.

“Quando participantes xingaram, foram capazes de deixar sua mão na água por aproximadamente 40 segundos a mais do que quando eles falaram uma palavra normal. Além disso, os participantes relataram que sua percepção da dor foi menor quando xingaram.”

2. Insulto, agressão and exclusão

Não é necessário usar palavrões para ofender alguém. Um simples “você é horrível” já transmite a mensagem, mas palavrões aumentam a intensidade da maldade. Eles também mostram a intensidade da raiva: por que explicar que você odeia seu vizinho se “Vai se f%&§@!” coloca esse imbecil no seu lugar?

Lembre-se: se você xingar pessoas que não podem ouvir o que você fala (pessoas dentro de carros com janelas fechadas, atletas na televisão), você só está desabafando, o que pertence a categoria anterior (catarse).

3. Dinâmica de grupo

Entre amigos, xingar tem uma função social crucial. Compartilhar um vocabulário específico e quebrar tabus une as pessoas. O ritual de insultos entre amigos não é agressivo, mas sim um sinal de que se pertence a um grupo. Nesse contexto, algumas palavras perdem seu sentido de insulto. As pessoas tendem a xingar mais em grupos do mesmo gênero e quando a atmosfera é um pouco mais tranquila. Nesses casos as pessoas xingam menos quando as coisas estão tensas.

4. Estilo e ênfase

Para comediantes, palavrões são uma arma poderosa. Um palavrão dito no momento certo causa um processo alquímico que transforma chumbo em ouro. Não há como enfatizar uma declaração de forma melhor do que usando aquela palavra mágica no lugar de um substantivo chato. Palavrões acrescentam emoção e urgência a frases até então neutras.

Por que xingar chama tanta atenção?

Para seu cérebro, palavrões não são nem mesmo palavras, mas sim um agrupamento de emoções. Eles são armazenados em uma parte do cérebro completamente diferente da parte usada para qualquer outra palavra que conhecemos! A linguagem formal está localizada em duas áreas do cébrebro chamadas Broca e Wernicke. Palavrões, no entanto, são armazenados no sistema límbico, um sistema complexo de redes de neurônios que controla as emoções e o ímpeto.

Por isso, há casos de pessoas com um forte grau de afasia ( danos cerebrais causados por um derrame que afetam a linguagem) que ainda conseguem dizer “bem”, “sim”, “não”, “droga” e “merda”, mesmo tendo perdido sua capacidade de falar. Alguns são até mesmo capazes de usar essas palavras no contexto apropriado, mas não conseguem lê-las.
Esse conhecimento na área neurológica nos ajuda a explicar por que todo esforço para reprimir o palavrão falhou. Proibir palavras que na verdade estão ligadas a emoções é tão impossível como proibir as emoções. Conhecendo a natureza humana, podemos dizer que essa merda jamais funcionará.

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Katrin Sperling

Katrin (Kat) Sperling nasceu e cresceu em Potsdam, Alemanha e mudou-se para Toronto, Canadá depois de terminar o ensino médio. Uma vez que suas cartas para Hogwarts não chegaram até o seu vigésimo aniversário, ela decidiu estudar Anglística e Linguística germânica em Berlim. Felizmente, linguistas acabam virando verdadeiros mágicos e por isso, agora, Kat está muito feliz em escrever sobre aprendizado de idiomas para a revista da Babbel.

Katrin (Kat) Sperling nasceu e cresceu em Potsdam, Alemanha e mudou-se para Toronto, Canadá depois de terminar o ensino médio. Uma vez que suas cartas para Hogwarts não chegaram até o seu vigésimo aniversário, ela decidiu estudar Anglística e Linguística germânica em Berlim. Felizmente, linguistas acabam virando verdadeiros mágicos e por isso, agora, Kat está muito feliz em escrever sobre aprendizado de idiomas para a revista da Babbel.