Como dezenas de milhões de pessoas no Brasil, eu tenho ascendência italiana: lá por 1800 e quase 1900, meus trisavós e seus três filhos nascidos na Itália embarcaram em um navio que tinha como destino o porto de Santos sem conhecer ninguém no país, sem falar português e sem saber direito o que os aguardava do outro lado do mar. Mais de um século e três gerações depois, eu sou a primeira da família a voltar a morar na Itália e tirar a cidadania italiana.
Arrisco dizer, também sou a primeira a ter essa vontade. Desde pequena, ter origem italiana era algo que me despertava curiosidade, antes mesmo de entender o que isso significava. Inflava o peito para falar que minha família era italiana e achava graça quando a professora brincava com a pronúncia do meu nome e sobrenome na chamada. Sabia que tinha direito à cidadania italiana, mas ninguém da minha família tinha ido atrás disso, então eu não fazia ideia de como funcionava. Era sempre uma coisa que eu poderia fazer algum dia, que “tem que ver direitinho”, “quem sabe ano que vem”, “um dia eu paro para ler sobre”. Sempre foi algo que ficou para o futuro.
Depois de muitos anos de tentativas frustradas de morar fora do país, que incluíram projetos nunca concretizados de intercâmbio, work & travel, au pair, meses sabáticos e inúmeros currículos enviados em inglês, percebi que a melhor chance que eu tinha de realizar esse sonho seria graças à família que, há mais de cem anos, largou tudo para ir para o Brasil.
Cidadania italiana na Itália
Ao decidir obter minha dupla cidadania, o primeiro passo foi escolher onde faria o processo: no consulado italiano no Brasil ou na Itália. A decisão entre um ou outro depende do que cada pessoa achar mais adequado. No Brasil, a demora é de anos, mas o valor é muito menor; na Itália, o reconhecimento é feito em alguns meses, mas o investimento chega às dezenas de milhares de reais, especialmente pelo alto valor do euro.
Minha decisão foi pela segunda opção, porque, além de garantir a cidadania europeia em menos tempo, me permitiria passar alguns meses morando em outro país pela primeira vez. De quebra, seria na Itália, que sempre tive vontade de conhecer, mas acabei postergando enquanto aprendia outros idiomas e me familiarizava com outras culturas.
O lado bom dessa procrastinação é que, no fim, nenhuma experiência é desperdiçada. Todas me ajudaram, direta e indiretamente, a me preparar para a viagem mais importante da minha vida: um país completamente novo, no qual eu não conhecia ninguém e onde falava apenas o básico da língua.
Sabia que conseguiria me virar, porque já fiz isso inúmeras vezes em países diferentes, em situações mais ou menos perigosas; sabia que poderia aprender o idioma, porque aprendi inglês e espanhol sozinha, com músicas e filmes; e sabia que duraria ao menos quatro meses, porque poupei dinheiro por cerca de três anos para viver nesses primeiros meses na Europa sem poder trabalhar (até a cidadania ser reconhecida, eu sou turista na Itália).
Benefícios da cidadania italiana
Após conseguir a cidadania italiana, uma série de portas são abertas, especialmente na Europa. Como o país faz parte da União Europeia, é possível morar e trabalhar legalmente em qualquer um dos 27 países do bloco, aproveitando a qualidade de vida notória dessa região e o custo de vida relativamente mais baixo.
Estudar também se torna mais fácil, com maior disponibilidade de vagas e bolsas de estudo nas universidades para quem tem cidadania europeia. A longo prazo, usufruir de benefícios como auxílio-desemprego e aposentadoria também são direitos de quem tem cidadania italiana. E, para quem pretende voltar para o Brasil, o euro é muito mais valorizado que o real e permite fazer um bom pé de meia em poucos anos.
Para viajar, há mais benefícios: além de poder transitar pela União Europeia, o passaporte italiano é o 4º “mais poderoso” do mundo. Com ele, é possível entrar em 192 países sem a obtenção de um visto. Um deles são os Estados Unidos, segundo país mais visitado do mundo: um italiano precisa apenas preencher o formulário ESTA pela internet, pagar a taxa de 14 dólares e aguardar a autorização (ou a recusa) em até 72 horas.
Em comparação, o passaporte brasileiro está em 19º lugar no ranking, permitindo a visita a 170 países sem um visto prévio.
O idioma italiano
Outro motivo que me empolgou para vir para a Itália foi aprender italiano, e as razões por trás disso são extremamente pessoais.
O italiano é falado em poucos países do mundo: além da Itália, é utilizado em algumas partes da Suíça, da Eslovênia e da Croácia, além do Vaticano e de San Marino, que são países localizados dentro do território italiano.
No entanto, o idioma é, na Europa, o terceiro mais comum, falado por 63 milhões de pessoas. Também é considerado, pelo British Council, uma das 10 línguas mais importantes nos próximos anos. Portanto, aprender italiano pode abrir ainda mais portas do que o passaporte vermelho, especialmente se a intenção for ficar na Europa.
Morar no país ajuda, claro, pois a imersão é ótima para aprender uma nova língua. Mas não é a única forma: ouvir músicas, assistir a filmes, ler notícias e até utilizar aplicativos de idiomas são maneiras práticas e rápidas de se familiarizar com novos idiomas. A maior dica é praticar diariamente, mesmo que rapidinho: com a Babbel, por exemplo, é possível aprender com apenas 15 minutos por dia.
Eu quero aprender italiano, claro, para me conectar mais profundamente com a cultura do país dos meus bisavós. Se conseguir continuar morando na Itália, vejo como uma obrigação ser fluente no idioma oficial. Ainda mais depois de me tornar cidadã italiana!
O segundo é porque tenho muita facilidade em aprender novas línguas e acho um “desperdício de habilidade” ser fluente apenas em português e inglês. E, em dois meses de Itália, já vejo muitas melhorias: até gesticulo igual a eles e troco algumas palavras do português! Só falta a carta d’identità, o RG italiano, para me consagrar italianíssima. 😉