“Gestos emblemáticos: são sinais emitidos intencionalmente, o seu significado é específico e muito claro, já que representa uma palavra ou um conjunto de palavras bem conhecidas.” – Ana Cristina Carvalho Pereira
Não é de hoje que nós brasileiros temos fama de ser bem expressivos, de falar com as mãos. Herança talvez da imigração italiana (dê uma olhada neste vídeo aqui), ou quem sabe da mistura luso-africana de tempos ainda mais remotos. Uma coisa é certa: nós usamos e criamos muitos gestos.
Morar em Berlim, uma cidade com cultura que eu diria ser quase antagônica à nossa, me deu a possibilidade de observar o nosso comportamento sob outra perspectiva. “Observar?”, você me pergunta. Sim, observar o comportamento de nós brasileiros. Estar fora do Brasil e ter contato não só com a cultura alemã, mas com a espanhola, a francesa, a italiana, e até mesmo a iraniana, me deu uma boa base para fazer comparações, e hoje tenho uma nova perspectiva sobre a cultura brasileira. Minha identificação com a seguinte frase do escritor português José Saramago, não poderia ser maior: “Para se ver a ilha é preciso sair da ilha.”
Foi só vivendo aqui na Alemanha que eu percebi (e muitas vezes me disseram) a quantidade enorme de gestos que eu utilizo diariamente. E, depois de muitos olhares de espanto, julgamentos indevidos e também mal-entendidos hilários, cheguei à conclusão de que a linguagem não verbal no Brasil é quase um patrimônio nacional. Depois de muitos estrangeiros ficarem surpresos com a forma de eu me expressar, decidi olhar com mais cuidado para nosso hábito de gesticular.
Mas afinal, o que nos leva a gesticular tanto? É fato que todas as culturas possuem os seus gestos característicos, e muitas vezes alguns gestos com sentido positivo aqui podem não ser tão legais no outro lado do globo.
De acordo com George H. Mead, sociológo norte-americano, “a conversação por gestos está na origem de qualquer linguagem e é o modelo de qualquer comunicação já que comporta dois aspectos de qualquer processo social: a reação de adaptação do outro e a antecipação do resultado do ato.”
Ou seja, a gesticulação possui um papel importantíssimo na construção da identidade cultural e da vida em sociedade. Além disso, os gestos variam de acordo com a cultura e a demanda da vida social dos indivíduos – claro que em países com interações sociais diferentes os gestos também serão diferentes (ou até inexistentes, dependendo do caso).
Eu arrisco ainda afirmar que o nosso clima quente (que relaxa mais as pessoas e as deixa mais expansivas – o frio não ajuda quando o assunto é linguagem corporal) e a história miscigenada do país também contribuíram em peso para que na nossa cultura de “falar pelas mãos” seja tão comum. Achei também bem interessante um estudo da universidade de Illinois em Urbana-Champaign. Os pesquisadores observaram 50 estudantes, que fizeram diversos testes. Alguns exploraram vocabulário enquanto outros trabalharam a memória de trabalho verbal – a habilidade de guardar, mudar e ajustar palavras em nossa mente. Depois disso, um desenho do Tom e Jerry foi exibido. Eles pediram aos estudantes para descrever o que viram. O resultado? Os estudantes com uma memória de trabalho verbal pobre (mas não pobre em vocabulário) tiveram a tendência de gesticular muito mais enquanto descreviam o que viram anteriormente.
Esse estudo mostra como os gestos nos auxiliam no processo cognitivo, em um lugar onde a memória de trabalho de certa forma falha. Imagine você um país como o Brasil, influenciado por tantas culturas e idiomas, os gestos definitivamente devem ter sido o melhor artificio para todos se comunicarem de forma mais eficiente.
Outro estudo (em inglês) também detectou que os gestos nos ajudam a lembrar de informações visuais ou espaciais, e inclusive podem alterar a nossa habilidade de sentir empatia. Será por isso que os brasileiros são considerados um povo tão simpático e hospitaleiro?
Beijinho no ombro à parte, este vídeo acima é apenas uma pequena mostra de alguns de nossos gestos, e de quão divertido pode ser quando aquele amigo estrangeiro se depara com eles.
Uma coisa é fato: não importa quantos idiomas você fala, ou quantos lugares você possa ter morado, a brasilidade de alguma forma sempre será parte de sua vida e se manifestará de alguma maneira. No meu caso isso acontece através de gestos!
fonte: https://theamericanscholar.org/wave-your-hands-and-say-it-right/#.VzH6D9OqpHw