Qual é a diferença entre língua e dialeto? O que é dialeto?

A única regra para definir: não há regras.

“Uma língua é um dialeto com exército e marinha.”

Nos anos 1940, o sociólogo e linguista judeu-russo Max Weinrich popularizou essa frase como um exemplo claro e provocativo de que os critérios para distinguir língua e dialeto são arbitrários e têm mais a ver com decisões e disputas geopolíticas do que necessariamente com determinações linguísticas.

Mas, o que é dialeto? Língua? Deve existir algum jeito de saber. Não?

Há entre os acadêmicos de linguística, sociologia e antropologia um critério para ajudar a classificar se um código de comunicação comum é dialeto, sotaque ou língua. O problema é que mesmo esses critérios deixam margem para interpretação:

  • O sotaque caracteriza uma variação fonética. Quando falamos, por exemplo, das diferentes formas de pronunciar a letra r nas diferentes regiões brasileiras, estamos falando de sotaque. Quando discutimos, portanto, diferentes maneiras de pronunciar exatamente as mesmas palavras… sotaque.

Note que o termo sotaque sempre necessita de uma língua de referência para fazer sentido – no caso do exemplo acima, o português. Assim como o sotaque, o dialeto também sempre faz referência a uma língua:

  • Quando falamos de diferenciações que incluem vocabulários e estruturas gramaticais distintas, aí já podemos considerar dialeto (também chamado de variação). Dialetos são versões de uma língua oficial (esta geralmente determinada por decisões geopolíticas – viu só?) que contêm palavras e/ou uma gramática diferentes. Isso significa que as variações da língua portuguesa faladas no Brasil são diferentes dialetos. O critério da inteligibilidade mútua é usado por linguistas para entender o que é um dialeto e o que pode ser considerado uma nova língua.
  • Já um idioma é o sistema de comunicação comum usado por um grupo de pessoas ou uma comunidade. Se há muitas variações (dialetos) na mesma região, entende-se que o idioma é formado justamente pelos elementos em comum entre todos aqueles dialetos.

Por que dizemos que esses critérios deixam margem para interpretação? Bom, porque para começar, isso significa que sotaque e dialeto só existem em relação a uma versão “oficial” do idioma, que geralmente é definida arbitrariamente, por questões políticas. Obviamente, a decisão nem sempre é tomada com base no idioma que as pessoas realmente falam no dia a dia. E, ao longo da história, perseguições e proibições de idiomas foram peças centrais em disputas de poder, conquistas territoriais e guerras culturais.

Além disso, ao dizer que dialetos são variações de um idioma em que os falantes podem se entender, precisamos decidir o que “entender” significa. Eu e você sabemos que “entender” não é um conceito absoluto nesse caso. Em alguns casos, é possível entender a versão escrita, não a falada; não dá para entender o que se escreve, mas sim o que se escuta.

O português e o espanhol são línguas diferentes, com gramática e vocabulário distintos. Mas muitos de vocês, falantes de português, dirão que entendem espanhol, ainda que um pouco, mesmo sem ter estudado a língua. O veneto, idioma falando no norte da Itália, embora tenha uma gramática e um vocabulário diferente do italiano, é compreensível por quem fala italiano. Guardadas as diferenças, é possível dizer que o veneto é tão distante do italiano quanto o português é do espanhol. Mas, nesse exemplo, o veneto é um dialeto e o italiano é um idioma. A mesma reflexão vale para a língua catalã, chamada de dialeto. E por aí vaí.

Há, por exemplo, a noção de contínuo dialetal, quando os falantes dos idiomas A e B se entendem, e os falantes dos idiomas B e C se entendem, mas os falantes de A e C não se entendem. Em um caso desse, como sabemos o que é língua, o que é dialeto? Não sabemos.

Em resumo, não há critérios ou definições que se aplicam a todos os casos. As línguas e os códigos de comunicação são organismos vivos, fluídos, que se comportam de maneiras particulares dependendo de tantos fatores que é improvável, em alguns casos, criar regras que deem conta de todas as possibilidades.

Contribuíram Mahayana Cristina Godoy, professora de linguística na Universidade Federal do Rio Grande do Norte, e Natália Prado, professora de linguística na Universidade Federal de Rondônia.

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