A Alemanha é conhecida mundialmente por sua cultura de cerveja. Logo que cheguei em Berlim, percebi que poderia tomar uma cerveja diferente a cada dia, sem repetir, e que os 365 dias do ano não seriam suficientes para tanto. Além de saborosas, as cervejas alemãs possuem muita história, e a mais curiosa de todas para mim é a da Sternburg, uma das cervejas mais populares da Alemanha.
O primeiro fato interessante sobre a Sternburg é o preço: uma garrafa de meio litro custa 45 centavos. Como consequência disso, a maioria das pessoas bêbadas nas ruas de Berlim têm sempre uma Sterni nas mãos.
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Por este motivo, pedir uma Sternburg em um bar ou comprar a cerveja no mercadinho da esquina virou um tabu hoje em dia. Mas este preconceito velado nem sempre existiu.
A Sternburg vai completar 200 anos em 2022, e o fato de ser uma cerveja tão barata é reflexo da sua história. A cervejaria abriu as portas em 1822, ano que o Brasil declarava a independência de Portugal. Um ano depois, a Sternburg já estava sendo fabricada na adega de um castelo, na cidade de Leipzig, que fica a 163 km da atual capital alemã.
Bom, a biografia da Sternburg também faz parte da biografia da Alemanha do século XX. Assim, durante a Segunda Guerra Mundial, a mancha dos trabalhos forçados aparece no currículo da empresa. A proporção de trabalho forçado correspondeu a 13% da força de trabalho total.
Depois da Segunda Guerra e como parte da República Democrática Alemã (RDA), a Sternburg tornou-se uma cervejaria estatal e exportava cerveja para a União Soviética e para todo o Bloco Oriental. Neste período, aliás, se você estivesse a bordo de um avião da Interflug, a companhia aérea nacional da Alemanha Oriental, certamente lhe seria servida uma Sterni.
Se olharmos hoje para as características visuais da marca Sternburg, como o uso do vermelho ou mesmo a estrela icônica na tampa da garrafa, é possível dizer que são heranças desta época.
Após a reunificação, a cervejaria voltava a ser uma empresa independente e lançava a Sternburg Export e a Sternburg Pilsner. Com isso, a empresa se tornou a primeira cervejaria da Alemanha Oriental a atingir os padrões de garantia de qualidade da União Europeia. Até o presente momento, a Sternburg é vendida apenas na Ostdeutschland (Alemanha oriental) e na capital, Berlim.
A partir da década de 1990, a Sternburg adotou uma política de não publicidade e se tornou uma marca de “desconto”. Mas o que isso significa? Isso quer dizer que você não via e ainda não vê os atores em novelas ou filmes tomando uma Sterni. Isso significa que você não via e não vê atores e a atrizes famosas estampando campanhas publicitárias da empresa. Logo, a popularização da cerveja é feita no boca a boca, o que no caso da Sternburg seria centavo a centavo.
Em relação à qualidade, a Sternburg não é a minha cerveja alemã preferida. Aliás, no ranking das cervejas da Beer Advocate, a Sternburg Export aparece com uma avaliação de 2,76 de 5 pontos. Contudo, não se trata apenas de qualidade, mas de história. Imagine que durante a RDA, essa era uma das únicas cerveja que podiam ser compradas nos supermercados na Alemanha Oriental.
Quando converso hoje com pessoas que viveram na Alemanha Oriental durante a RDA, muitas dizem que, por uma questão de costume, ainda tomam a Sternburg como a cerveja do cotidiano.
O slogan da Sternburg é Merke Dir – Sternburg Bier! Em uma tradução livre para o português – e sem rima – seria algo como: Lembre-se – cerveja é Sternburg! Na minha opinião, não existe verbo melhor do que lembrar para descrever essa cerveja. Sempre que um amigo ou um familiar me visita em Berlim, gosto de abrir a degustação de cervejas com uma Sternburg, pois é o momento perfeito para descrever a história da cidade e do próprio país.
Então fica aqui a minha dica: se você visitar Berlim ou qualquer uma das cidades do leste da Alemanha, deixe o preconceito com as cervejas baratas de lado e lembre-se da Sternburg!