“Filler words”: usar ou não usar?

Um, er, you know, I mean estão entre certas filler words que provocam ira em muita gente, mas alguns linguistas acham essa fama injusta. Aqui mostramos como usar essas palavrinhas tão controversas.
L'apprentissage des langues peut vous aider à combattre les préjugés et stéréotypes les plus communs ?

Quando falamos naturalmente e sem roteiros, deixamos pistas de onde nascemos, dialetos e sotaques. Além disso, em geral, a comunicação oral nem sempre é contínua. Segundo um estudo conduzido por James W. Pennebaker, professor do Departamento of Psicologia da Universidade de Texas (EUA), e outros dois pesquisadores, essas interrupções no fluxo normal da fala podem chegar a seis para cada 100 palavras. Algumas dessas intermitências são definidas em inglês (e não necessariamente em português) como marcadores de discurso (palavras ou frases que ajudam a administrar o fluxo de uma fala), outras não contam com o mesmo prestígio e são mais comumente chamadas de filler words.

As filler words existem em diversos idiomas, mas em inglês os exemplos mais comuns são so, um, uh, er, like, you know, right e I mean (em português, as mais usadas são: entende, certo, né, tá, compreende e veja bem). Na língua inglesa, elas costumam aparecer no começo ou no meio das frases e há algumas teorias sobre suas funções.

Um, uh e er, por exemplo, tendem a ser considerados como um artifício para inserir uma pequena pausa no discurso ou indicar que uma pessoa ainda não concluiu sua fala, entre outros usos. Por outro lado, like, you know e I mean podem ser utilizados para sinalizar aos ouvintes a transição entre diferentes partes de uma conversa (embora muitas vezes não tragam conteúdo gramatical relevante), conforme defende Pennebaker, em estudo que analisou as transcrições de conversas orais cotidianas de participantes para compreender melhor a aplicação de cinco filler words.

Segundo Pennebaker e seus colegas, os significados de filler words determinam sua função. Por exemplo, a frase I mean serve como uma indicação de que o interlocutor está planejando modificar o que é dito. You know, por sua vez, é usado para confirmar a compreensão de um ouvinte.

Já sobre fillers como um, uh, er, esses pesquisadores consideram que podem ser simples interrupções inconscientes, pausas para o interlocutor concluir seu raciocínio, ou um sinal para manter o ouvinte atento. Para eles, muitos ouvintes tendem a ver essas pausas como uma indicação de incerteza por parte de quem fala.

Em diversos artigos na internet, especialistas em discurso, comunicação e até mesmo psicólogos tratam o uso de filler words como um pecado mortal, capaz de prejudicar sua credibilidade ou custar oportunidades profissionais. Há quem defenda que elas indiquem hesitação, despreparo e insegurança, além de distrair os ouvintes, prejudicar a clareza da fala e serem mal vistas em ambiente de trabalho. Mas aqui entra um debate interessante proposto por linguistas.

Enquanto muitas pessoas pedem para que abandonemos as filler words para parecermos “mais inteligentes e confiantes”, diversos linguistas destacam que a reputação dessas palavras é injusta e que elas são muito úteis. E são antigas também: o Oxford English Dictionary registra o hum pelo menos desde 1469 e o er desde 1862, mas elas provavelmente existiam muito antes dessas datas.

Em entrevista ao jornal britânico The Independent, Michael Handford, professor de Linguística Aplicada e Inglês na Universidade de Cardiff (Reino Unido), defendeu que as pessoas costumam usar filler words para se expressarem de forma educada em situações difíceis. Por exemplo, recusar um convite para um evento com um simples “no, thank you” seria bem rude. Já “uh, well, you know, I’m sorry” suaviza a resposta. 

De acordo com Handford, também empregamos essas palavras inconscientemente quando falamos de temas complexos e sabemos que os ouvintes precisam de algum tempo extra para entender parte da mensagem antes de prosseguirmos.

Outra defensora de filler words é a antropóloga linguística Jena Barchas-Lichtenstein, doutora pela Universidade da Califórnia em Los Angeles (EUA). Em um post em seu site, ela pede que essas palavras parem de ser vilipendiadas. 

Segundo a linguista, outros marcadores de discurso não malfadados do inglês como and, but, now, then, next, therefore, because são considerados fundamentais para a fluência daquele idioma. Ou seja, livrar-se deles significaria limitar a língua. 

Barchas-Lichtenstein explica que as pausas verbalizadas dão mais tempo para pensarmos no que falar e permitem suavizar discórdias, críticas e temas delicados. Por exemplo: The thing is, she worked really hard; Um, it’s not my favorite; ou Sooooo, um, how are things at home? 

N.J. Enfield, professor de Linguística na Universidade de Sydney (Austrália), segue uma linha semelhante a Barchas-Lichtenstein, mas lembra que precisamos distinguir entre falas espontâneas e discursos em públicos. No primeiro caso, não há roteiros e filler words são uteis para facilitar a compreensão. No último, elas são desnecessárias, irrelevantes e pouco apropriadas. 

Isso ocorre porque em muitos discursos públicos (ou em apresentações profissionais), o palestrante teve tempo de preparar e ensaiar o seu discurso com antecedência. Desta forma, em muitos casos é possível garantir a fluência linguística e a articulação das ideias. Além disso, nesses cenários, em geral, os ouvintes sabem que é a sua vez de falar. Logo, a chance de interrupção é pequena, mesmo se o palestrante ficar por alguns segundos em silêncio.

O debate sobre filler words tem nuances interessantes. Então, caso você decida usá-las com moderação, dicas de especialistas incluem: prestar atenção na sua fala, pedir para amigos avisarem sobre exageros, gravar a si mesmo por alguns minutos e depois escutar para perceber excessos, ou simplesmente substituí-las por uma pausa silenciosa. A escolha é sua!

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